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Marvin Gaye: o homem, o soul e a alma.

Frequência Modulada

03/04/2019 01h14

Dois de abril, dia de agradecimentos. Nós aqui não somos muito adeptos das homenagens póstumas (artistas precisam de reconhecimento em vida), mas esse infelizmente não tivemos tempo hábil de estar em show. Herói dos grandes, influência para quase que todos artistas da música preta (até os que não assumem) e com um legado imperecível: Marvin Gaye.

Marvin Pentz Gay, Jr. nasceu em Washington, DC em 1939. Foi criado sob o rígido controle de seu pai, um rígido reverendo. Interessante ressaltar que o "e" no final de seu nome anos depois por conta do ministério de uma igreja local, por conta de uma vizinhança tomada pelo discurso de ódio, já naqueles anos.

Ao longo de sua infância, ele encontrava a paz na música, dominando o piano e bateria em tenra idade. Até o colegial, sua experiência de canto foi desenvolvida nos eventos da igreja, mas logo desenvolveu um amor pelo R&B e pelo doo-wop (uma vertente do R&B clássico, famosa pela harmonia vocal – bem pegada de The Platters ou The Temptations) que estabeleceria a base de sua carreira. Com seu primeiro grupo, o Moonglows, abriu shows e escreveu canções em parceria com Bo Diddley, mas as vendas não foram muito bem e ele partiu para carreira solo.

O talendo de fato seria rapidamente perceptível pelos executivos da música que tinham justamente as igrejas como "incubadora" de artistas e, atendendo a um convite foi cantar em uma festa de um desses executivos. Por sinal, no processo inicial de um novo negócio. Um tal Berry Gordy, administrando uma jovem Motown Records.

Lá de fato teve contato com os grandes. Os irmãos Jackson, Gladys Knight, The Supremes (inicialmente como baterista da banda e rendendo um de seus sucesso mais um álbum em dueto com Diana Roos), Stevie Wonder. Dezoito álbuns e toda uma vida carregando a bandeira de uma gravadora; obviamente abrilhantada com os demais talentos mas, é difícil separar as histórias de ambos.

 

Como boa parte dos gênios…

Marvin foi um cara difícil em sua vida pessoal. Enquanto fez parte da Força Aérea Americana foi exonerado por conta de seu espírito livre. Durante um hiato na carreira musical teve vontade de jogar football americano no Detroit Lions, mas o técnico na época se recusou (igual ao Simonal querendo jogar no Santos). Era de intensidade e excessos, nas drogas e nos amores. Tão ligado a perceira Temi Terrel em sucessos como Ain't no Montain High Enough, prometeu não subir no palco com mais ninguém pelo resto de seus dias. Teve três esposas (uma delas filha de Barry Gordy) e, de tanto amor por tudo que fazia por muitas vezes se decepcionava. Tentou suicidar-se três vezes.

Legado

Nossa geração, além das dicas dos pais teve contato com sua obra de formas bem diferentes. Com o mashup no clássico do produtor de New Jersey (e monstro sagrado e subestimado) Eric Sermon em um hit e álbum de nome Music (com várias colagens das frases de Turn on some music) e, em uma das interpretações mais fiéis o cantor Joe Thomas fez um belo refrão em sua parceria com a banca G-Unit, de 50 Cent em I Wanna get to know you. 

Temos releituras lindíssimas de um mesmo sucesso, Got to Give it up sucesso das pistas dedicadas à soul music em São Paulo. Uma declarada de Mayer Hawthorne, Henny and Gingerale – perfeita releitura e homenagem. Em 2011 Blurred Lines  de Robin Thické em 2013 que, precisou ser levadas aos tribunais para o devido crédito de sample. Custou ao cantor e a Pharrell Williams um boletinho singelo de cinco milhões de dólares. Precisava?

 

 

Legado (para nós)

Dj Nyack:

Álbum Here My Dear, 1978

Marvin Gaye estava no processo de separação, Anna Gordy filha do dono da gravadora de qual ele fazia parte, Berry Gordy da Motown Records. Após várias brigas e conversas entre os advogados de ambas as partes, chegaram em um acordo no qual Marvin Gaye abriria mão de todos os honorários de seu proximo disco. MG malandro que só, teve a idéia de fazer um disco não Pop e ironicamente deu o nome de "Here, My Dear" ao disco. O disco de fato flopou, mas a sonoridade alcançada nele é indiscutívelmente incrível. Destaques para as músicas: Funky Space Reincarnation, Anna's Song, Anger e Time to Get It Together

 

Fabio Lafa:

Álbum In Our Lifetime, 1981:

Lançado logo no começo daquele ano, dois meses antes de eu nascer. Fui encontrá-lo bastante tempo depois mas o que me marca é que, a proposta de um anjo e um demônio do mesmo Marvin nos coloca em questionamento sobre nossa própria dualidade, nossos pontos positivos que escondem o que realmente precisamos melhorar. E sujeira embaixo do tapete nunca é bom. Êxodo urbano, evolução da produção fabril e por consequência a destruição da natureza, além uma liberdade perdida em meio à uma sede de conquistas da Nação norte-americana. Obra muito importante, oscilando entre letras e arranjos de festa e outros de reflexão e tristeza declarada nas letras. Destaco uma faixa de intersecção entre esses vários sentimentos, Heavy Love Affair: Ali, a ironia entre a fama que trazia milhões de pessoas pra cima dele, mas um dor que ele estava fadado a carregar sozinho.

 

Mesmo com uma bela retomada na carreira após In our lifetime, Marvin Gaye tinha uma dura batalha contra as drogas. Depois de sua última turnê, optou por voltar a morar com os pais e, voltando também as antigas divergências de opinião seguidas de briga pesada com o pai. Em 1 de abril de 1984, o referendo Marvin Gaye Sr. tomou dois tiros disparados por seu próprio pai, de um calibre 38 que ele mesmo deu. Por uma discussão boba sobre um documento que havia sumido. O pai alegou legítima defesa, e respondeu e foi condenado por homicídio culposo. O reverendo Gay nunca se perdoou, na verdade. Morreu em 1998 de pneumonia, afirmando amar o filho e desejando trazê-lo de volta, se pudesse.

 

Várias outras histórias em torno da vida pessoal e carreira desse que foi um dos responsáveis pela nossa música estar desse tamanho. Se em algum momento você tropeçou em alguma música de Marvin Gaye e não foi pego, tente de novo. É sério. Volte aos clássicos, e não precisa nos agradecer. Até semana que vem.

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Sobre os autores

Fabio Lafa escreve textos, podcaster, pesquisador musical e consultor em music branding.

Nyack é Dj, pesquisador musical e beatmaker.

Juliano BigBoss é estudioso do marcado do rap, pesquisador, produtor artístico e executivo.

Sobre o blog

Papo semanal e bem descontraído sobre os ritmos que movem cidades. Dicas e mapeamento de cenários musicais - clássicos e emergentes, do analógico ao eletrônico.

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